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ATENÇÃO PRIMÁRIA A ESTRANGEIROS RESIDENTES EM MUNICÍPIOS FRONTEIRIÇOS (DE FRONTERA)
(especial para SIIC © Derechos reservados)
Autor:
Luiza Helena Cazola de Oliveira
Columnista Experta de SIIC

Institución:
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Artículos publicados por Luiza Helena Cazola de Oliveira 
Coautores Renata Palópoli Pícoli* Maria Elizabeth Araujo Ajalla** Edson Mamoru Tamaki*** 
Fonoaudióloga, Universidade Anhanquera - Uniderp, Campo Grande, Brasil*
Farmacéutica, Universidade federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, Brasil**
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, Brasil***


Recepción del artículo: 26 de marzo, 2014
Aprobación: 5 de mayo, 2014
Conclusión breve
Com o (Con el) objetivo de identificar a magnitude e o (y el) perfil dos (de los) serviços de saúde prestados aos (a los) estrangeiros, foi feito em (fue realizado en) 2007 um diagnóstico da (de la) situação em três municípios fronteiriços (de frontera).

Resumen

A fronteira do (La frontera del) Estado de Mato Grosso do Sul (MS), Brasil, com o Paraguai abriga (abarca) áreas urbanas contíguas ou (o) próximas que criam um terceiro espaço (crean un tercer espacio), com valores e traços (y trazos) culturais, étnicos e linguagens peculiares, que facilita a circulação de pessoas, animais, mercadorias e a busca (y la búsqueda) de diversos serviços, inclusive o de saúde (los de salud). Nesse contexto a população estrangeira, que não tem direito (no tiene derechos), busca o atendimento no (atenderse en el) Sistema Único de Saúde (SUS) que é gratuito e universal. Uma parcela dessa (Una parte de esa) população é atendida, sobrecarregando e onerando os (sobrecargando y exigiendo a los) serviços de saúde brasileiros, e criando situações (y generando situaciones) complexas de direitos à saúde. Com o objetivo de identificar a magnitude e o perfil dos serviços de saúde prestados aos (a los) estrangeiros, foi feito em (fue realizado en) 2007 um diagnóstico da (de la) situação em três municípios fronteiriços de MS com o Paraguai. Além (Además) de entrevistas com 24 informantes-chave, durante 30 dias foi feito um levantamento com (un relevamiento con) cada usuário de todas as 15 unidades públicas de saúde dos três municípios. Em caso de dúvidas (dudas), era feita uma pesquisa in loco para confirmação. Constatou-se uma diversidade de situações de atendimento de estrangeiros com predomínio dos não (de los no) residentes no (en el) país. A utilização dos serviços de saúde variou de acordo com as (de acuerdo con las) características da rede (de la red) de serviços prestado por cada município. Entre os serviços hospitalares o mais (el más) utilizado foi o (fue el) atendimento ambulatorial (ambulatorio). Um problema crítico identificado foi a responsabilidade do município pela vida do (por la vida del) paciente no (en el) momento em que ele (en que él) necessita de serviços mais complexos e não são aceitos pelos (y no son aceptados por los) SUS.

Palabras clave
saúde na fronteira, salud en la frontera, direito à saúde, derecho a la salud, política de saúde, política de salud, serviços de saúde, servicios de salud

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/135527

Especialidades
Principal: Salud Pública
Relacionadas: Atención PrimariaBioéticaEpidemiologíaMedicina Familiar

Enviar correspondencia a:
Luiza Helena Cazola de Oliveira, 79040-452, Campo Grande, Brasil


Health services for foreigners living in border municipal districts

Abstract
The border between the State of Mato Grosso do Sul (MS), Brazil, and Paraguay with its contiguous or nearby urban areas, creates a third space, with peculiar cultural, ethnic and linguistic traits and values that facilitate the movement of people, animals, goods, and the search for various services, including health care. In this context, the foreign population that lacks such rights, resorts to the services of the Unified Health System (SUS) that is both free and universal. A portion of this population is attended, overloading the Brazilian health services and making them more expensive, while creating complex situations for the right to health. In order to identify the magnitude and profile of health services provided to foreigners, a diagnosis of the situation in three border municipal districts of MS with Paraguay was made in 2007. In addition to interviews with 24 key informants, a survey was made over 30 days with each user of all the 15 public health units of the three municipal districts. Where there were information doubts, field research was conducted for the purposes of corroboration. A diversity of health care situations provided to foreigners was revealed, principally to non-residents in the country. The use of health services varied according to the characteristics of the network of services provided by each municipal district. Among hospital services, the most commonly used was outpatient care. A critical problem identified was the responsibility of the municipality for the patient's life when more complex services are required and are not supported by the SUS.


Key words
health in the border, health right, health policies, health services


ATENÇÃO PRIMÁRIA A ESTRANGEIROS RESIDENTES EM MUNICÍPIOS FRONTEIRIÇOS (DE FRONTERA)

(especial para SIIC © Derechos reservados)
Artículo completo
Introdução

 A faixa de fronteira do Brasil com seus países vizinhos é compreendida dentro dos 150 km de largura paralela à linha divisória terrestre do território nacional. Esta delimitação teve como fundamento a defesa do território nacional, determinando uma regulação própria quanto à sua ocupação.1

As cidades fronteiriças que possuem áreas urbanas contíguas ou próximas, de alguma maneira integram-se e criam um terceiro espaço, com valores e traços culturais, étnicos e linguagens peculiares dessa localidade, que facilita a circulação de pessoas, animais, mercadorias e a busca de diversos serviços de saúde.4 Essa busca deve ser considerada, uma vez que elas auferem ao setor saúde uma complexidade maior que de outras regiões fronteiriças do país.1 
Esse espaço próprio tem evidenciado em seu trânsito interfronteiriço, questões que envolvem o direito à saúde e do exercício de cidadania da população estrangeira, devido à ausência de titularidade formal do direito à saúde, garantido para a população brasileira. A não titularidade reflete na assistência dos atendimentos pelo SUS, visto que os gestores municipais atendem a essas demandas com dificuldades técnicas e financeiras, muitas vezes descontínuas e fragmentadas, pelo fato da legislação garantir apenas assistência em situação emergencial.2,3
A presença de estrangeiros pela busca de serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) em municípios fronteiriços depende da região, tipo de fronteira e país fronteiriço do Brasil, no entanto, destaca-se nesse conjunto a fronteira do Estado de Mato Grosso do Sul com o Paraguai.5
Em Mato Grosso do Sul, são onze os municípios que fazem fronteira com o Paraguai, cujas características geográficas apresentam-se distintas, sendo seis com áreas urbanas contíguas (quatro são cidades-gêmeas), dois com áreas urbanas próximas e três distantes de áreas urbanas.

Com o intuito de identificar a busca de atendimentos por estrangeiros nessa fronteira, o Ministério da Saúde, por meio do Projeto de Sistema Integrado de Saúde das Fronteiras (SIS-Fronteiras) em parceria com os 11 municípios da linha fronteiriça com o Paraguai e a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, realizaram um diagnóstico situacional de saúde nesses municipios.6
A partir desse projeto identificou-se uma maior presença de demanda de atendimentos a usuários estrangeiros nos municípios de Paranhos, Coronel Sapucaia, que apresentam fronteira com áreas urbanas contíguas (cidades gêmeas) com os municípios do Paraguai: Ipehú e Capitan Bado; e Mundo Novo com proximidade de área urbana com o distrito de Salto del Guairá.

Visando aprofundar o conhecimento sobre as implicações desse atendimento no sistema de saúde brasileiro, o estudo realizado teve por objetivo identificar a magnitude e o perfil dos serviços de saúde prestados aos estrangeiros residentes ou não no Brasil, nesses três municípios fronteiriços de Mato Grosso do Sul com o Paraguai.

 
Métodos

 Estudo exploratório com abordagem quali-quantitativa, realizado em três municípios fronteiriços do Estado de Mato Grosso do Sul: Paranhos, Coronel Sapucaia e Mundo Novo, no período de maio de 2006 a setembro de 2007.

Utilizaram-se dados primários coletados em todos os serviços públicos de saúde disponíveis nos três municípios estudados: três Unidades Básicas de Saúde (UBS), oito Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF), quatro Hospitais, por um período de 30 dias. A Atenção Primária no Brasil é oferecida por dois tipos de Unidades: as UBS que têm como característica atender qualquer usuário que necessite dos seus serviços de saúde enquanto que as UBSF, por assumirem a responsabilidade pela saúde de um território delimitado atendem a população residente vinculada à sua unidade.

Para se identificar o atendimento aos estrangeiros, pesquisadores previamente treinados, preenchiam os formulários elaborados para esse fim, com informações sobre nacionalidade, local de residência e tipo de atendimento utilizado, que eram registradas no momento da recepção do paciente na unidade de saúde, sem comunicação direta com o mesmo. Em caso de dúvidas, era feita uma pesquisa in loco para confirmar a veracidade da informação fornecida pelo usuário. Todas as portas de entrada dos serviços de saúde foram cobertas pelos pesquisadores durante o período de seu funcionamento. Entrevistas semiestruturadas, também, foram aplicadas pela equipe técnica da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), junto aos secretários de saúde ou seu representante legal, gerentes de todas as unidades de saúde (18 no total) e seis representantes do conselho municipal de saúde, identificados numericamente como Informantes-Chave (IC1, IC2, etc). As entrevistas foram transcritas e analisadas com o propósito de identificar as implicações decorrentes dos atendimentos prestados aos estrangeiros.

Os resultados foram analisados por estatística descritiva com frequência absoluta e porcentagem, e discutidos a partir da literatura pertinente.



Resultados e discussão

 A partir dos resultados obtidos, por meio das entrevistas com os Informantes - Chave ( ICs) verificou-se diferentes situações no que se refere à busca de atendimentos de usuários estrangeiros, para os diferentes tipos de serviços de saúde, que são oferecidos pelos municípios fronteiriços brasileiros. Essas situações foram confirmadas por meio dos depoimentos dos ICs, que se declararam preocupados:
Sim, o maior problema que nós enfrentamos é os estrangeiros [...] o maior problema mesmo são os estrangeiros que pelo fato de ser uma fronteira seca que não existe nenhum amparo pra se deslocar até aqui, então eles nos procuram [...]. (IC1). 

Dentre os serviços relatados por maior demanda, destacaram-se os de imunização, assistência ao pré-natal/parto e doenças infecto-contagiosas, como a tuberculose: 

[...] eles vem pra vacinar, vem fazer ultrassom, fazer um parto no hospital e registram as crianças no Brasil (IC2). 

Consultas de rotina, principalmente as gestantes que a gente tem bastante, gestante que faz o programa Sis-Pré-Natal, vêm de várias cidades do Paraguai. Vem fazer preventivo que a gente detecta as DSTs. Também com TB vários pacientes vem do Paraguai, mas é tratado aqui né, a gente não tem distinção. Pacientes hipertensos, diabéticos tenho vários que fazem tratamento contínuo (IC3).

No que diz respeito às doenças infectoparasitárias existe uma preocupação com a vigilância dos casos diagnosticados pela dificuldade de acompanhamento e prevenção de novos casos, tendo em vista a grande mobilidade transfronteriça da população.7
Essa preocupação aumenta, quando usuários estrangeiros necessitam ser encaminhados para serviços de maior complexidade, na região em que se encontram:
Nós não conseguimos porque precisa de Cadastro de Pessoa Física, precisa de cartão SUS (IC4). 

É a gente não consegue mandar eles pra Dourados ou para Campo Grande, porque eles são barrados lá, porque eles têm documento estrangeiro, são estrangeiros (IC5). 

Quando caso o paciente é paraguaio mesmo a documentação é toda paraguaia a gente tem encontrado resistência junto à central de regulação no ato de solicitar a vaga (IC6).

Outra situação identificada é quando se depara com a necessidade da prestação do cuidado ao usuário estrangeiro nos hospitais, nos casos de urgência e emergência, que são amparados legalmente. 

 A mãe chega de última hora, ela não faz nenhum pré-natal, o que é muito ruim para nós, chega pra ganhar nenê e nós não podemos omitir socorro então primeiro a gente vai atender e depois pergunta se é brasileiro [...](IC7).

Em estudo realizado por Giovanella et al.,5 apenas 28% dos municípios atendem estrangeiros em situação de emergência e 36% prestam, além da emergência, outros tipos de serviços.

No entanto, quando o estrangeiro busca outros serviços hospitalares, torna-se um problema para o serviço municipal, tendo em vista que os repasses financeiros não contemplam o pagamento dos mesmos, conforme mencionado:
Até o momento não temos um recurso especifico. Em valores não, tem porcentagem, eu acredito que pelo menos 40% do orçamento é gasto com pessoas estrangeiras (IC8).

[...] eu acompanho toda essa dificuldade que nós temos, que esse hospital tem, eu penso que talvez se aumentasse o nosso teto, porque o que acontece todos os meses nós temos sobra de laudos que não podemos mandar porque nós temos uma quantia X de teto, de valores, e então se melhorasse pra nós esse teto, o número de AIHs ou tivéssemos uma ajuda do próprio governo Paraguaio eu penso que seria talvez uma forma de melhorar (IC9).

Na identificação dos usuários estrangeiros atendidos no país evidenciou-se a existência de várias situações de moradia e legalidade nos municípios pesquisados:
Estrangeiro não residente no Brasil, com visto;
Estrangeiro não residente no Brasil, sem visto;
Estrangeiro legalizado que reside permanentemente no Brasil com visto;
Estrangeiro legalizado que reside temporariamente no Brasil com visto;
Estrangeiro não legalizado residente no Brasil, com visto temporário vencido;
Estrangeiro não legalizado residente no Brasil, sem visto;
A busca de atendimentos desses estrangeiros nos serviços de saúde dos municípios fronteiriços, representou uma importante demanda, conforme pode ser observado nas Tabelas 1 e 2.











Nas Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF), observou-se predomínio de atendimentos a estrangeiros não residentes no Brasil, 79 (84.9%) em Paranhos, desses 51 (54.8%) realizaram consultas médicas. Embora em número reduzido, 7 (7.5%) desses estrangeiros buscaram consulta pré-natal o que evidencia a possibilidade da assistência ao parto, também ocorre nesse município. 

Embora o estudo não tenha mostrado a questão da cidadania brasileira como um importante atrativo para realização do pré-natal e parto, o estudo realizado por Nogueira, Dal-Prá, Fermiano,8 destaca como uma das vantagens a aquisição da cidadania brasileira para os filhos entre as razões para busca do atendimento no Brasil.

O fato de Paranhos ser uma cidade-gêmea com o município Paraguaio de Ipehú, influencia na dinâmica das relações sociais, culturais e de saúde, sendo essa última ainda favorecida pela gratuidade dos serviços oferecidos pelo SUS brasileiro.

A gratuidade e universalidade como atrativo é também comprovada no estudo de Peiter,9 nos serviços de atenção básica, em especial a atenção pré-natal, serviços de imunização e obtenção de medicamentos gratuitos.

No município de Mundo Novo não houve registro na UBSF, de atendimentos por estrangeiros não residentes no Brasil, o que pressupõe contemplar o princípio de territorialidade, ou seja, atender a população residente no território da unidade, conforme estabelecido pela Política Nacional de Atenção Básica.10
Este resultado mostra conforme descrito por Nogueira, Dal-Prá, Fermiano,8 que a implantação da Estratégia de Saúde da Família vem se constituindo como obstáculo para o acesso dos estrangeiros ao sistema, devido à exigência de adstrição dos usuários. 
Por outro lado, os atendimentos prestados na Unidade Básica de Saúde de Mundo Novo, que não exige territorialidade, 85 (91.4%) foram a estrangeiros não residentes no Brasil, sendo o serviço de imunização o único procurado.

Em Coronel Sapucaia observou-se o registro de atendimentos em sua UBS, tanto a estrangeiros não residentes no Brasil como de estrangeiros residentes não legalizados, 35 (56.5%) e 27 (43.5%), respectivamente. Os serviços de maior procura para os estrangeiros não residentes no Brasil foram consultas médicas com especialidade para clínica geral 12 (19.4%), seguidos igualmente pelo serviço de imunização, assim como para os estrangeiros residentes no Brasil não legalizados 3 (4.8%) e 16 (25.7%).

A realização de atendimentos a estrangeiros não residentes ou não legalizados no Brasil, não estão previstos nos recursos financeiros da atenção básica, já que sua base de cálculo é estabelecida a partir da estimativa populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), onerando os cofres públicos municipais e refletindo numa maior demanda de atendimentos.

Situação semelhante foi identificada em um estudo, realizado com os gestores dos municípios de fronteira, por Giovanella et al.5 onde 74% apontam estas mesmas dificuldades.

Nas unidades hospitalares, assim como na atenção básica, também os estrangeiros não residentes no Brasil apresentaram maior proporção de atendimentos, sendo representados por 52 (92.8%) em Mundo Novo, 61 (91.0%) Paranhos e 25 (80.6%) em Coronel Sapucaia. O serviço com maior atendimento foi o Ambulatório nos três municípios: 46 (75.4%) em Paranhos, 38 (73.1%) em Mundo Novo e 14 (56.0%) em Coronel Sapucaia. A seguir, Internação em Paranhos, 7 (11.5%), e Pronto Socorro em Mundo Novo e Coronel Sapucaia, 11 (21.15%) e 8 (32.0%), respectivamente.

Dificuldades para essas internações são encontradas pelos serviços hospitalares quando estrangeiros não residentes no Brasil ou não legalizados não possuem documentação, visto que para o pagamento das Autorizações de Internação Hospitalar (AIH´s) os mesmos são obrigatórios. Na ocorrência dessas internações, os custos financeiros também serão custeados apenas pela instituição hospitalar, a não ser em situação de urgência e emergência, situação essa que é paga com recursos do SUS.

Os critérios de financiamento dos serviços de saúde municipais e Estadual, não contemplam a utilização dos serviços por essa população flutuante, o que onera e afeta a qualidade do serviço, prejudicando sobremaneira uma população já desprovida de infra-estrutura básica, tanto social, quanto física. Os municípios fronteiriços são de pequeno porte e distantes dos centros de referência. A falta de recursos humanos especializados, insuficiência de equipamentos para realização de procedimentos de média e alta complexidade são as principais justificativas apresentadas pelos gestores para a dificuldade de planejamento nesses municípios.11
Os problemas desses atendimentos são ampliados quando os municípios necessitam referenciar esses estrangeiros não residentes no Brasil ou não legalizados para municípios que oferecem serviços de maior complexidade, pois fogem do âmbito da sua governabilidade.

Tal situação foi verificada por Nogueira, Dal-Prá, Fermiano,8 que identificaram raros casos de usuários estrangeiros que conseguiram prosseguir com o tratamento de saúde de alta complexidade em outro município, utilizando- se de documentos falsos.
Apesar dessas situações se apresentarem reduzidas, podem causar problemas extremamente sérios que evoquem questões legais, de esfera de competência dos órgãos públicos do município, do estado e da União, de relações internacionais, de direitos humanos e de responsabilidade pela vida de um ser humano. Independentemente da forma em que um atendimento a um indivíduo foi aceito por um serviço de saúde, essa responsabilidade passa a ser da unidade que o atendeu, criando situações extremamente complexas, desgastantes e conflituosas uma vez que a vida de um ser humano vai depender das decisões e encaminhamentos que forem dadas ao caso.

O direito de o usuário estrangeiro ser atendido é visto desde como um ato cristão até como um direito decorrente de igualdade, independente da origem, nacionalidade, cor e condição econômica, traduzindo subjetivamente uma concepção de cidadania que ultrapassa os limites territoriais brasileiros.8
Em estudo realizado em Mato Grosso do Sul, internações hospitalares por paraguaios representaram 83.62% do total das registradas entre estrangeiros, sendo responsável por 78.13% dos gastos no período de 2003 a 2007, principalmente, nas cidades de Mundo Novo, Ponta Porã, Bela Vista, Porto Murtinho, Coronel Sapucaia e Sete Quedas.12
Em face da complexidade de regiões de fronteira com as particularidades dos municípios estudados, desse terceiro espaço como o denomina Ocampo,4 uma possibilidade de qualificar o atendimento do sistema de saúde brasileiro seria a criação de Regiões de Saúde Fronteiriças, em que gestores das três esferas de governo possam estabelecer e implementar estratégias de atuação que contemplem as necessidades da população que ali vive.13
 

Considerações finais

Este estudo mostrou que em Mato Grosso do Sul os estrangeiros que utilizam dos serviços de saúde nos municípios da fronteira apresentam uma diversidade de situações, desde os que estão legalizados no país até os que não residem no país, mas que se utilizam do sistema de saúde brasileiro pelas mais variadas razões. Este cenário dificulta sobremaneira a organização de uma região de saúde sem levar em consideração essa realidade. 

A seriedade e a complexidade dos atendimentos dos estrangeiros da fronteira envolvem a definição do direito e da responsabilidade de financiamento; a política de integração regional e de relações internacionais com os países vizinhos; a organização, regulamentação e oferta do atendimento pelos SUS em todos os níveis de complexidade. Constata-se a necessidade de uma ampla discussão e elaboração de políticas de saúde especificas para estes municípios, assim como o estabelecimento de parcerias bilaterais entre Brasil-Paraguai, a fim de possibilitar soluções concretas aos problemas identificados. 
 
Bibliografía del artículo
1. Tamaki EM, Ferraz AF, Pontes ERJC, et al. O projeto SIS fronteiras no Estado de Mato Grosso do Sul. In: Souza ML, et al (org). A saúde e a inclusão social nas fronteiras. Florianópolis: Fundação Beitux pp. 177-208, 2008.
2. Gallo E, Costa L, Moraes A. A integração dos sistemas de saúde que atendem a população fronteiriça dos países do Mercosul - Sis-Mercosul. In: Gallo E, Costa L, (org). Sis-Mercosul: uma agenda para integração. Brasília: Organização Panamericana da Saúde pp. 41-53, 2004.
3. Dal Prá KR. Transpondo fronteiras: os desafios do assistente social na garantia do acesso à saúde no Mercosul [Dissertação]. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2006.
4. Ocampo HT. OPAS e a saúde nas fronteiras: uma proposta em prol do bem estar da população e do desenvolvimento sustentável. In: Costa L. Integração de fronteiras: possibilidades Brasil-Bolívia na Saúde. Brasília: Organização Panamericana da Saúde pp. 107-117, 2006.
5. Giovanella L, Guimarães L, Nogueira VMR, Lobato LVC, Damacena GN. Saúde nas fronteiras: acesso e demandas de estrangeiros e brasileiros não residentes ao SUS nas cidades de fronteira com países do Mercosul na perspectiva dos secretários municipais de saúde. Cad Saude Publica 23(Suppl. 2):251-66, 2007.
6. Brasil, Ministério da Saúde. Portaria 1.120/GM/2005. [acesso em 15 mar 2013] Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/Port_1120-05.pdh.
7. Peiter PC. A geografia da saúde na faixa de fronteira continental do Brasil na passagem do milênio. [Tese]. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005.
8. Nogueira VMR, Dal Prá KR, Fermiano S. A diversidade ética e a política na garantia e fruição do direito à saúde nos municípios brasileiros da linha de fronteira do Mercosul. Cad Saude Publica 23(Suppl. 2):227-36, 2007.
9. Peiter PC. Condiciones de vida, situación de la salud y disponibilidad de servicios de salud en la frontera de Brasil: un enfoque geográfico. Cad Saude Publica 23(Suppl. 2):237-250, 2007.
10. Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília, 108 p. 2012.
11. Gadelha CAG, Costa L. Integração de fronteiras: a saúde no contexto de uma política nacional de desenvolvimento. Cad Saude Publica 23(Suppl. 2):214-226, 2007.
12. Carvalho EAM. Autorizações de internações hospitalares de estrangeiros pelo Sistema Único de Saúde no Estado de Mato Grosso do Sul. [Monografia]. Campo Grande, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 2008.
13. Bontempo CGC, Nogueira VMR. Assistência à saúde na fronteira com o Uruguai: estratégias para qualificação de atendimento pelo SUS. Revista Ideação 13(1):139-156, 2011.

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